Autorretrato com 23 anos, 1629
Museu
Mauritshuis de Haia -
Holanda
Filho
apaixonado de sua época, Rembrandt nunca hesitou em se mostrar por meio de
diversos autorretratos,
evidenciando em cada um deles o impacto de viver intensamente. Os
autorretratos formam uma biografia única e íntima na qual o artista se
retrata sem qualquer vaidade e com uma sinceridade extremada. Nos seu
últimos anos, Rembrandt pintou seus autorretratos mais reflexivos (de 1652
a 1669 ele pintou quinze deles). Enquanto muitos artistas produziam,
no máximo, cinco autorretratos durante toda a vida, Rembrandt descreve-se
em aproximadamente 40 a 50 pinturas, 32 gravuras e diversos desenhos.
Muitos estudiosos concordam que os autorretratos de Rembrandt refletem sua
jornada pelo autoconhecimento.
Os autorretratos de Rembrandt formam um capítulo
singular na História da Arte. Além do grande número já realizado, o
artista retratou-se nos diferentes períodos de sua vida (juventude,
maturidade e velhice) marcando as diferentes leituras que fazia de si
mesmo ao longo dos anos. Rembrandt revela não apenas as mudanças que a
vivência trouxe ao seu aspecto físico, mas essencialmente ao seu espírito
interior.
Nesta obra vemos uma figura jovem e ingenuamente vaidosa.
A gola da roupa, de característica militar, dá uma certa formalidade à
aparência pessoal. A fisionomia jovial de frente para o espectador e com a
metade do rosto iluminado valoriza a postura do conjunto. O cabelo de
Rembrandt apresenta-se suave nos seus tons castanhos, ganhando especial
beleza através dos fios alourados pela luz, formando uma expressiva mecha
que pende sobre sua testa. A vivacidade da juventude, com seus desejos e
ambições, está contida no olhar confiante do artista. A pintura apresenta
um realismo muito admirado
pelos holandeses da época.
Este autorretrato do início de sua
carreira atesta a importância da
iluminação em sua linguagem. O
contraste entre sombra e luz divide seu rosto em duas partes, formando uma
linha invisível que realça a verticalidade da figura. A sombra da cabeça
no plano de fundo ressalta a face iluminada e acentua a expressividade do
conjunto facial. Os tons terrosos que predominam no quadro, junto com a
luz da composição, resultam em um pequeno plano retangular iluminado, para
onde a atenção do nosso olhar é concentrada. O olhar percorre a gola
branca, passando pelos lábios ligeiramente avermelhados e vai até a mecha
loura de cabelos.
Desde cedo Rembrandt estudou a luz para sublinhar
o que lhe era mais significativo em suas obras, seja o conteúdo das
narrativas religiosas, seja a expressão e misticismo dos retratos
(e autorretratos) e das pinturas de
gênero. A luz é o instrumento com o qual Rembrandt interpreta a si mesmo e
aos outros. Suas interrogações acerca da alma humana ficam evidentes nos
retratos que fez de si. Mesmo tão jovem, aos 23 anos, ele já intuía que a
sua própria auto-imagem retratada seria o testemunho mais fiel de sua
biografia.
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